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quarta-feira, 25 de janeiro de 2012

Hegel: Toda a Realidade é Espirito.


A realidade é um processo histórico.  


A associação entre Hegel e Schelling é importante contextualmente e vinha desde os tempos do seminário de Tubingen, onde, junto com Hoerderlin, então amigos inseparáveis, saudaram a queda da Bastilha e a proclamação da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão plantando uma "árvore da liberdade". Mais tarde, Hegel traduzirá em teoria esse entusiasmo juvenil - na Fenomenologia do espirito, sua primeira grande obra, concluída durante a batalha de Iena (1807), e que marca a sua ruptura com Schelling:

Apesar de ser mais velho do que Schelling, Hegel começou sua carreira intelectual como um discípulo deste. Seu primeiro texto publicado foi, precisamente, "Diferença entre os sistemas de Fichte e Schelling", no jornal de filosofia que, a partir de 1802, ambos editam em Viena. Sua entrada em cena foi precedida, entretanto, por uma série de estudos sobre seus predecessores alemães - Kant, Fichte e Schelling - e análises históricas e teóricas, tecnicamente pouco filosóficas, que vão desde a economia (como o comentário sobre o livro do inglês Steuart, que traduziu) até a religião (como "Vida de Jesus", "O espírito do cristianismo e seu destino") e a política (como "A Constituição da Alemanha").

O destino dos três amigos é, aliás, paradigmático da evolução histórica da Alemanha: se Schelling se torna cada vez mais conservador a ponto de ser chamado pelo Estado, após a morte de Hegel, para ocupar a sua cátedra em Berlim e dar combate ideológico à "cabeça de hidra" que é o pensamento hegeliano ao que ele se opunha; se Hoerderlin permanece  utopicamente  ligado  aos  ideais  da  revolução  num ambiente sociopolítico profundamente hostil, a ponto de enfrentar o isolamento e a loucura; Hegel, por sua vez, modera o seu entusiasmo inicial, recusa as expressões revolucionárias mais radicais e formula a primeira grande teoria da sociedade moderna, tomada como produto da revolução.

Sociedade Civil x Estado Politico. 

A sociedade civil (Burgerliche Gessellschaft) é definida como um sistema de carecimentos, estrutura de dependências recíprocas onde os indivíduos satisfazem as suas necessidades através do trabalho, da divisão do trabalho e da troca; e asseguram a defesa de suas liberdades, propriedades e interesses através da administração da justiça e das corporações. Trata-se da esfera dos interesses privados, econômico-corporativos e antagônicos entre si.

A ela se contrapõe o Estado politico, isto é, a esfera dos interesses públicos e universais, na qual aquelas contradições estão mediatizadas e superadas. O Estado não é, assim, expressão ou reflexo do antagonismo social, a própria demonstração prática de que a contradição é irreconciliável, como dirá mais tarde Engels, mas é esta divisão superada, a unidade recomposta e reconciliada consigo mesma. A marca distintiva do Estado é esta unidade, que não é uma unidade qualquer, mas a unidade substancial que traz o indivíduo à sua realidade efetiva e corporifica a mais alta expressão da liberdade.

Deve-se chamar a atençäo, como o fez Norberto Bobbio, para o fato de que a sociedade civil hegeliana não engloba apenas, como a marxista, "a esfera das relações econômicas e a formação das classes, mas também a administração da justiça e o ordenamento administrativo e corporativo" (em O conceito da sociedade civil. Rio de Janeiro, Graal, s/d. p. 29).

Por outro lado, família e sociedade civil - as esferas que aparentemente estão fora e são anteriores ao Estado - na verdade só existem e se desenvolvem no Estado. Não há história fora do Estado. Não há nada fora da história.

Calma, não se desespere, é impossível, compreender a rigor o pensamento politico de Hegel, sem antes traçarmos os princípios básicos de sua filosofia, desde a dialética a teoria dos espíritos; de forma que estas estão intrinsecamente relacionada com sua teoria dos governos. Observe que apesar de que Marx teve boa parte de sua doutrina baseada em Hegel aqui não se estará falando nele, mas somente no que é extraído da teoria exclusivamente Hegeliana e não Marxista. 

Aspectos Ideológicos Principais. 

Tentarei passa brevemente nos principais aspectos ideológicos defendido por Hegel até chegarmos a finalidade ao qual me proponho a esse texto. 

Hegel foi o filosofo mais famoso da Alemanha na primeira metade do século XIX. Sua ideia central era de que todos os fenômenos, da consciência às instituições politicas, são aspectos de um único espirito (“mente” ou “ideia”, para ele) que ao longo do tempo reintegra esses aspectos em si mesmo.


Esse processo de reitegração é o que Hegel chama de “dialética”: um processo que nós (enquanto aspectos do espirito) entendemos como “historia”. Hegel era portanto, um monista (acreditava que todas as coisas são aspectos de uma única coisa) e um idealista (entendia a realidade essencialmente como algo não material (o espirito). A ideia de Hegel alterou radicalmente o panorama filosófico. 

As categorias de Kant em relação a Hegel.
Para Kant, os processo básicos por meio dos quais o pensamento funciona e as estruturas básicas da consciência são a priori – existem antes (portanto, não derivam) da experiência. Isso significa que são independentes não apenas do que estamos pensando, ou do que estamos pensando, ou do que estamos conscientes, mas também de qualquer influencia histórica ou aperfeiçoamento.

Kant chamou essas estruturas de pensamento de “categorias”, e elas incluem os conceitos “causa”, “substancia”, “existência” e “realidade”. Por exemplo, a experiência pode nos dar conhecimento sobre o mundo exterior, mas nada na própria experiência nos informa que o mundo exterior realmente existe, o que é algo que apenas admitimos. Para Kant, o conhecimento de que há um mundo exterior é, portanto, um conhecimento a priori. Ele só é possível porque nascemos com categorias que nos fornecem uma estrutura para a experiência – parte da qual é a suposição de que há um mundo exterior. No entanto, continua Kant, essa estrutura a priori só nos permite ver o mundo de um modo particular, mas pode haver outros modo de vê-lo, nenhum dos quais possivelmente representa o mundo como ele é realmente – ou como ele é em “si mesmo” é o que Kant chamava de mundo numênico, que seria incognoscível. Tudo que podemos conhecer, de acordo com Kant, é o mundo como ele se revela a nós por meio da estrutura das categorias. Isso é o que Kant chama de mundo “fenomênico”, ou o mundo da experiência cotidiana

A tarefa de Hegel foi intender essas categorias sem fazer qualquer suposição, e a pior suposição que Hegel viu em Kant diz respeito às relações das categorias umas com as outras. Kant supôs que as categorias são logicamente distintas (em outras palavras, não podem ser derivadas uma das outras). Para Hegel, elas são “dialéticas” ou seja, estão sempre sujeita à mudança. Kant imaginava uma estrutura imutável da experiência, enquanto Hegel acreditava que a própria estrutura da experiência sujeita à mudança, tanto quanto o mundo que experimentamos. A consciência, portanto, é não apenas algo sobre o qual estamos cientes, é parte de um processo de evolução. Um processo “dialético”- conceito que tem significado bem especifico no pensamento de Hegel.

Espirito e mente.
Na época em que Hegel escreveu havia uma visão filosófica dominante de que existem dois tipos de entes no mundo: coisas que existem no mundo físico e pensamentos sobre essas coisas (estes últimos sendo algo como retratos ou imagens das coisas). Hegel afimou que todas as versões dessa distinção são equívocos, ao envolver nosso compromisso com um cenário ridículo em que duas coisas são absolutamente diferentes (coisas e pensamentos), mas também de algum modo similares (porque os pensamentos são imagens das coisas).

Hegel disse que é somente aparente a diferença entre os objetos do pensamento e o próprio pensamento. Para Hegel, a ilusão de diferença e separação entre esses dois mundo “aparentes” se mostra quando o pensamento e a natureza são revelados enquanto aspectos do espirito. Essa ilusão é superada no espirito absoluto, quando vemos que existe apenas uma realidade: aquela do espirito que sabe e reflete em si, e é tanto pensamento quanto aquilo que é pensado.

A “totalidade do espirito”, ou “espirito absoluto”, é o ponto final da dialética de Hegel. No entanto, os estágios anteriores não são deixados para trás, por assim dizer, mas revelados como aspectos insuficientemente analisados da totalidade do espirito. De fato, o que pensamos sobre uma pessoa individual não é um elemento separado da realidade, mas um aspecto de como o espirito se desenvolve – ou como ele “extravasa no tempo – assim, Hegel escreveu: “ a verdade é o todo. Mas o todo é somente a essência que implementa por meio do seu desenvolvimento”. A realidade é o espirito – tanto o pensamento quanto aquilo que é conhecido pelo pensamento – que sofre um processo de desenvolvimento histórico.

Hegel e os contratualistas . 
 A elaboração das ideias hegeliana deve ser entendida tendo como pano de fundo o que vem antes dela, o que prossegue e contra o que  se insurge. Sua teoria política é, de certo ponto de vista, o momento mais alto a que chegou o jusnaturalismo (movimento que argumenta sobre as atribuição de leis naturais)Hegel reverte essa tradição,  modifica radicalmente, subvertendo os seus conceitos, criando novos, construindo um método e uma teoria global sem precedentes. A teoria contratualista faz do indivíduo o alfa e o ômega da vida social. Toma o Estado como algo derivado, uma criação artificial, produto de um pacto, ação voluntária pela qual os indivíduos abdicam de sua liberdade originária em benefício de um terceiro, dando vida a um corpo político soberano que lhes garanta vida, liberdade e bens. Tarefa precípua do Estado é, entäo, garantir a liberdade individual e a propriedade privada. Por essa via, entretanto, a teoria contratualista é incapaz de explicar por que o Estado pode exigir do indivíduo o sacrifício da própria vida em benefício da preservaçäo e do desenvolvimento do todo.

Ao fazer do interesse particular do indivíduo o conteúdo do Estado, ela está, segundo Hegel, confundindo Estado e sociedade civil. O Estado para Hegel, é algo que esta além das relações particulares entre individuo, Estado e sociedade civil são coisas diferentes.  Na verdade, o indivíduo sequer escolhe se participa ou não do Estado, ou seja, o individuo é constituído como tal pelo Estado e não o contrario como suponhava os antigos contratualistas. A relação entre os dois é, portanto, de outra natureza, somente como membro do Estado é que o indivíduo ascende à sua "objetividade, verdade e moralidade". A inversão hegeliana é completa. "A associação como tal é o verdadeiro conteúdo e o verdadeiro fim, o destino dos indivíduos é viver uma vida universal" diz ele. O Estado é a totalidade orgânica de um povo, não um agregado, um mecanismo, um somatório de vontades arbitrárias e inessenciais que parte de cada individuo. A força associativa do conjunto, da relação do todo com as partes, se revela precisamente na guerra, dessa forma o Estado é a força em si mesmo, e não a força associativa de uma serie de indivíduos.

Hegel relata que não por acaso a teoria dos antigos contratualista toma como modelo de Constituição do Estado, ou seja, a passagem do estado de natureza para o estado civil, como uma figura do direito privado, ou seja o contrato, que estatui relações de obrigatoriedade entre os pactantes, indivíduos,  que nada têm a ver com a substancialidade, universalidade e eticidade da vida estatal. O conceito que está na base do Estado não é o de contrato, mas o de vontade (universal).

A Questão da História
Característico dos jusnaturalistas é a contraposição entre princípios supra-históricos e a própria história. É por isso, diz Hegel, que eles procuram estabelecer como o Estado
deveria ser, em vez de tentar compreendê-lo como ele é. As conseqüências são dramáticas. Ao construírem a teoria do contrato, eles pressupõem a existência - lógica ou histórica, pouco importa - de indivíduos livres e iguais, vivendo isolados e separados uns dos outros, fora e antes da sociedade e da história. Criam uma ficção. Esta metodologia, que procura apreender formas objetivas da existência histórica por uma via apriorística e abstrata, apenas cristaliza antíteses históricas em antíteses teóricas, sem resolvê-las, observe que isso justifica a ideia de Hegel quanto ao Estado.

                                     Ao tomarem a natureza humana fora de seu desenvolvimento histórico, acabam por opor às manifestações concretas da história dos homens um conjunto de faculdades, uma possibilidade abstrata, um mero dever ser (sollen) a partir do qual pretendem refazer o estado de coisas existente (em Introdução à filosofia da história de Hegel. Rio de Janeiro, Civilização Brasileira, 1971. p. 64).

Nada mais distante de Hegel, cuja ambição era não elaborar uma filosofia da história, (se por esta se entende uma filosofia sobre a história) mas a de construir a filosofia enquanto expressão especulativa da própria história. Tendo, neste sentido, verdadeiro horror a qualquer tentativa de teorizar um ideal de Estado ou um Estado ideal, a partir do qual a realidade pudesse ser medida e "criticada". É assim que ele critica impiedosamente a realização prática do jusnaturalismo, especialmente em suas vertentes rousseauniana e robespierriana:

Conquistando o poder, estas abstrações produziram por um lado o espetáculo mais grandioso jamais visto pela espécie humana: recomeçar a priori, e pelo pensamento, a constituição de um grande Estado real, subvertendo tudo o que existe e é dado, querendo dar-lhe como fundamento um sistema social imaginado; de outra parte, como não são senão abstrações sem Idéia, engendraram, nesta tentativa, os acontecimentos os mais horríveis e os mais cruéis.

Entretanto, enquanto Hegel propõem uma filosofia sobre a historia de modo não especulativa, por outro lado elabora sua teoria do estado, tendo como base, princípios metafísicos, ironicamente depois esses mesmo princípios metafísicos,  (os espíritos de Hegel) serão bastante criticados como sendo especulação sobre algo o qual não se pode provar.

Particularidade: Propriedade e Liberdade
 O todo que precede a parte, o viver coletivo e universal que constitui o dever mais alto do indivíduo, aparentemente estamos de volta à concepção aristotélica que faz do homem um animal naturalmente social, um zoón politikón, e do Estado não apenas a esfera do viver junto, mas a associação para o viver bem, virtuoso.

Influenciado pela Revolução Francesa e por seu dedicado amigo Hoerderlin, o jovem Hegel um dia acreditou na possibilidade de restauração da polis grega. Esta ilusäo foi abandonada por volta dos trinta anos, numa crise que coincide com o fim do período napoleônico, a partir da qual Hegel descobre o que considera a marca distintiva da modernidade.Numa original interpretação da República platônica, ele recusa-se a analisá-la como uma utopia, um modelo normativo ou um ideal que nada tem a ver com a realidade concreta. Considera A República, ao contrário, como a verdade do mundo grego, o sentido para o qual este tendia e teria alcançado, não tivesse sido bloqueado pelo aparecimento da particularidade/individualidade.

Ora, é este mal que é portador de futuro. A liberdade subjetiva, a autonomia da pessoa privada só aparece interiormente com o cristianismo e exteriormente com o mundo romano. Este, no entanto, só foi capaz de pôr uma universalidade abstrata diante de uma pessoa também abstrata. Apenas na modernidade é que a particularidade se emancipa, toma consciência de si e se universaliza. Característico do Estado moderno é ser justamente um todo que subsiste na e através da mais extrema autonomização das partes. Deve-se chamar a atenção para o fato de que esta concepção não escapou de ser acusada de totalitária, porque organicista. O pressuposto do argumento é que o fundamento epistemológico e ontológico da democracia não pode não ser o individualismo, e a visão hegeliana, ao contrário, compartilha com qualquer organicismo o princípio aristotélico do todo que é maior do que a soma das partes.

O problema desta interpretação é que pouco há de comum entre uma totalidade que existe quando e porque desenvolve todas as determinações que é capaz de conter, ou seja há uma aglutinação de diferenças que vai mudando conforme e dai se torna uma, ou uma totalidade, ou seja, ela procede não por aniquilação e eliminação das partes mas por sua diversificação e autonomização, e uma totalidade na qual as determinações e todas as diferenciações desaparecem.

A Liberdade Concreta.
Aristotelicamente, é livre quem é por si mesmo e não por outro. Quem é dependente não é livre. Em suas Lições sobre a filosofia da história universal, Hegel diz que "o Oriente sabia e sabe que somente um é livre, o mundo grego e romano, que alguns são livres, o mundo germânico sabe que todos são livres".

Esta teoria da liberdade que se realiza historicamente está na base de sua teoria das formas de governo de Hegel, que retoma a classificação de Montesquieu: "Em consequência, diz, a primeira forma que temos na história universal é o despotismo, a segunda, a democracia e aristocracia, a terceira, a monarquia". O critério fundamental que as distingue é, como lembrou Bobbio, a maior ou menor complexidade da sociedade. O que faz com que cada Estado tenha uma e somente uma Constituição - a que corresponde ao "espírito do povo”. O leitor já terá suspeitado que, para chegar a tais resultados, foi preciso elaborar um novo conceito de liberdade. Como tudo em Hegel, não existe liberdade em geral. O conceito desta supõe sempre o seu contrário, no caso concreto, a existência de determinada coerção, variável historicamente.

No sentido de Locke, liberdade, se define pela ausência de qualquer constrição e, em seguida, pelo limite que outra liberdade me opõe. Sou livre, portanto, para fazer tudo aquilo que a lei (natural ou positiva) não prescreve. Rousseau avança para além dessa liberdade meramente negativa, em direção à liberdade positiva: só obedeço ao que eu próprio me dou como lei. Ambas, especialmente a primeira (Locke), se traduzem num sistema de direitos (civis, mas, em seguida, também políticos e sociais), garantidos por lei e pelo ordenamento estatal, direitos estes que estão historicamente, em maior ou menor grau, à disposição dos cidadãos. A segunda (Rousseau) configura especificamente essa participação política nos negócios do Estado por parte dos indivíduos que têm por meta fins particulares e os negócios da sociedade civil.

Considerando-a como um estado em que o homem pode se realizar como homem e construir um mundo adequado ao seu conceito, a concepção hegeliana de liberdade concreta exige que a liberdade se eleve à consciência da necessidade - vale dizer, dos nexos objetivos e da legalidade própria da natureza e da história, das leis de seu desenvolvimento objetivo -, à compreensão do que a realidade é, porque o que é, é a Razão.  Em suma, a liberdade é aquilo que não se oponha ao todo, elevando-a somente à consciência da necessidade, consciência guiada pela razão e não pela particularidade, essa é a liberdade para Hegel.  

A Reação a Hegel.
A preocupação de  Hegel  não é,  como vimos, apenas construir uma teoria do Estado legítimo, uma nova justificação racional do Estado, entretanto, ele avança para atribuir ao Estado as características da própria razão. Ora, ao considerá-lo "a realidade em ato da idéia ética", o "racional em si e para si", o absoluto no qual a liberdade encontra sua suprema significação - ele despertou a suspeita generalizada de que estaria muito prosaicamente justificando o Estado existente tal como era.

Seu sistema não iria resistir aos golpes da crítica. Menos de uma década após sua morte, sua escola se divide numa esquerda e numa direita (mais tarde, essas duas escola culminaram respectivamente no socialismo e no nazismo), em suma isso ocorre, conforme cada uma adotou o método dialético a sua maneira – no qual denuncia a transitoriedade de todo o existente, ou o sistema ideal (no qual, teóricos suspeitaram que Hegel se referia a sua época)   considerando a possibilidade, de se alcança um estado perfeito, ou seja a história como tendo alcançado a sua meta definitiva, um estado no qual o povo caminhariam até alcançarem esse mesmo ideal. O que fez com que varias correntes procurassem alcançar tais metas adotando medidas extremas e imorais.

O retrato de um Hegel "conservador" foi fixado pela primeira vez em grande estilo por Rudolf Haym, em Hegel e seu tempo. Fazendo eco às teorias jovens hegelianas, Haym acusa Hegel de apologeta da Restauração prussiana e ditador filosófico da Alemanha. Hegel não só justifica o estado de coisas existentes na Alemanha junker, mas toda e qualquer forma de conservadorismo e quietismo políticos. A constituição de um ideário liberal, visão-de-mundo compatível com o progresso do mundo moderno e capaz de promover a unificação nacional da Alemanha, exigiria a prévia destruiçäo da teoria hegeliana, diz Haym.

Um moderno intérprete de Hegel, Eric Weil, empreendeu em 1950 uma das mais articuladas tentativas de defender Hegel. Em Hegel e o Estado não se contentou em lembrar que o Estado não é a última figura da Razão, do desenvolvimento histórico do Espírito - ele é superado pela arte e pela filosofia.

Dada a íntima relação entre Hegel e Marx, boa parte da vasta literatura sobre o primeiro tem sobretudo caráter polêmico, ora aproximando ora distanciando um do outro. Recentemente, tem-se privilegiado o exame da Filosofia do direito, provavelmente em função do relativo fracasso do marxismo em construir uma teoria da política suficientemente consistente e, ao mesmo tempo, capaz de dar conta dos processos ocorridos após Hegel e Marx e da ascensão do neoliberalismo como visäo-de-mundo capaz de revitalizar a teoria contratualista e enfrentar ofensivamente os problemas atuais da organização do mundo e da política.

Com Hegel, portanto, completa-se o movimento iniciado por Maquiavel, voltado para apreender o Estado tal como ele é, uma realidade histórica, inteiramente mundana, produzida pela ação dos homens. Nesse percurso foram definitivamente arquivadas as teorias da origem natural ou divina do poder político; afirmada a absoluta soberania e excelência do Estado; a especificidade da política diante da religião, da moral e de qualquer outra ideologia; reconhecida a modernidade e centralidade da questão da liberdade e, sobretudo – pois é esta a principal contribuição de Hegel -, resolvido o Estado num processo histórico, inteiramente imanente. E o motor desse espírito, que é razão e história, é "a dor, a seriedade, a paciência e o trabalho do negativo", expressões que comparecem ao "Prefácio" à Fenomenologia e devem ser lidas, conforme sugestão de Adorno, não como metáforas mas como conceitos.

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